Essa ligação está sendo gravada

Essa ligação está sendo gravada

Acordei e vi aquelas gotas escorrendo com preguiça pela janela. Era a chuva. Um convite para se reconciliar com o sono e se arrepender de ter transgredido a lei do sonho, que é acordar. Mas não consegui enquanto lembrei que acordara com um falatório, uma discussão do meu pai com o telefone. Pra mim, um monólogo. O cara tava discutindo, expondo vários argumentos contra a má qualidade na prestação de serviços da companhia de telefonia que assiste à minha avó, na sua casa.

Há mais de duas semanas que minha amada vovó e suas outras muitas vizinhas velhinhas estão sem telefone por um problema local e nenhuma providência é tomada. A situação é tão grave, mas tão grave, que nesse ínterim foi meu aniversário e a matriarca nem me ligar pode. A explicação da representante da empresa é que o problema é com uma firma terceirizada, e seria para eles que as reclamações teriam que ser direcionadas. Como cara-de-pau só tem sucesso quando não tem parte com a burrice, meu pai fez questão de lembrar que o contrato e o pagamento não são feitos a nenhuma empresa terceirizada e sim a eles, logo, cabe aos próprios resolver essa chatice.

Chatice essa que se estende atá aqui nesse texto mas agora se finda. Comentei tudo isso para sugerir minha nova especialização, curso, doutrinação ou seja lá qual for o nome que isso possa levar na grade curricular do ensino médio nacional. A iniciativa privada, as empresas, até as PPP's estão cada vez mais tomando conta da sociedade seja por meio de concessões ou omissão do estado. A cada dia fica mais claro e firme no inconsciente popular a dor de cabeça que é ligar para uma dessas prestadoras de serviço querendo cancelar ou comprar um serviço novo.

Não raramente as experiências, enxurradas de processos e piadas que envolvem a voz dos representantes dessas companhias tomam conta das conversas quer seja numa festa ou num almoço de domingo. Olhe ao seu redor e veja se você não conhece ao menos uma pessoa que trabalhe em um desses call center da vida. Não cessa o crescimento da demanda de mão de obra nessa área, assim como não diminui a relevância dessas empresas e as nossas necessidades, enquanto sociedade, num estilo de vida que cresce desenfreadamente misturando cada vez mais o que é seu privado com o público, criando literalmente uma rede de informações que, se cruzadas, definem exatamente quem nós somos — wikileaks, espionagem norte-americana é barbada! Profissional nesse ramo são os atendentes da c&a, pessoas que fazem cartões ou as redes sociais na tela do seu gadjet.

Pois bem, a minha sugestão, então, é que troquemos alguma dessas matérias retrogradas da escola e que não ensinam nada no final das contas, como matemática, história, geometria por uma disciplina que eu denomino “Como se comportar diante de um call center”. Que tal? Imagine uma nova geração equipada, que conhece e domina as aspirações e ofertas avassaladoras que virão do outro lado da linha antes mesmo delas serem ditas. Pense como seria melhor uma multidão de pessoas que conhece o comportamento e as intempéries que se armam numa dessas conversas, ate então inofensiva, para cancelar uma assinatura. Você há de concordar comigo o quanto de tempo, estresse e energia isso nos pouparia e que tudo isso convergiria para um estilo de vida melhor.

Pois bem, fica registrado minha sugestão, uma vez que no futuro nacional, esse domínio por parte das empresas só tende a aumentar se continuar esse governo que é de esquerda, de berço socialista, mas que vendeu o país para a iniciativa privada em um antro de corrupção...


...Pensando melhor, talvez outras matérias além desta teriam que ser adicionadas no colégio para poder entender essa vida melhor.

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